sábado, 30 de agosto de 2008

Que me desculpem os fãs apaixonados pela diva internacional Madona, mas é preciso que esta grande diva-pop faça muito mais para ser alçada ao posto que nós brasileiros demos a ela. Ninguém discorda do seu valor para a música pop, nem contesta os feitos numéricos alcançados por sua popularidade, mas aqui mesmo no Brasil temos uma artista comparável ao que nossa mídia costuma designar a cantora americana. Madona é um ícone mundial, mas é incrível como não reconhecemos que aqui mesmo, bem próximo a nós, Daniela Mercury festeja em sua carreira uma mescla de talento, ousadia e sim, sensualidade. E uma sensualidade sadia e instigante sem apelar pelo embate erótico como acontece por lá.

Mas é de praxe da cultura nacional invocar como ídolos aqueles que vêm de fora. Quando pisam por aqui, tais artistas empinam o nariz, fazem exigências e metade da população que os escuta nem sabe o que dizem as letras das músicas. Os ingressos para os shows ultrapassam a cifra dos R$ 200, isso para um lugar mediano, e a torcida é para que não se use play-back na maioria das canções. Grandes nomes da música mundial passaram pelo Brasil nos últimos anos e ganham destaque televiso, inclusive com shows exibidos na íntegra pela maior emissora do país, a Rede Globo.

Enquanto glamourizamos o produto americano menosprezamos o brasileiro. Pior ainda, quando se trata de uma “cria” baiana, o preconceito é maior. E esta seria a palavra que melhor se encaixaria aqui. Cantoras do quilate de Britney Spears, Cristina Aguilera, Jenifer Lopez, Beyoncé e tantas outras parecidas, seguiram os passos de Madona e são referências para a imprensa aqui. Mas referência de que? Por que um cantor ganharia pontos se comparados a tais estrelas? Musicalmente falando, o ritmo do axé-music é infinitamente superior, sim.

O que Madonna faz com a sua música encanta o mundo porque é divulgado a exaustão pela mídia e é um segmento explorado pelo mundo do entretenimento. O estilo de suas canções seguem e se repetem, se reciclam nas letras e nas superproduções dos vídeo-clipes, mas nada além disso. Nada que seja expoente na história da música e que a tornaria uma deusa. É uma deusa-produto, fabricada pela indústria. Talento, ela tem e é inegável, mas é um exagero os jornais brasileiros e os telejornalísticos abordarem a data de seu aniversário com a importância de uma “independência do Brasil”.

Camille Paglia, é uma das intelectuais americanas de cultura e arte mais importante dos EUA e escreveu um artigo que inspirou esta coluna, relatando no seu título, ser Daniela, a Diva Brasileira que Madonna gostaria de ser. Nenhum jornal ou emissora de Tv deu importância ao fato. Afinal, Daniela Mercury é uma cantora que surgiu nos trios elétricos do carnaval da Bahia e portanto não merecia destaque se a mesma informação tivesse sido dada a alguém como Ana Carolina ou Adriana Calcanhoto, estas sim, merecedoras de muitas linhas porque lançam discos intitulados de MPB, mas que regravam letras requentadas que poderiam cair na voz de qualquer cantor sertanejo. Não estamos discutindo voz, nem talento (ressaltando de novo), mas Ana Carolina “comeu” a Madonna e toda a crítica aplaudiu, quando se canta “toda boa” é uma apologia ao erotismo e não uma ode a mulher brasileira.

Os artistas baianos não podem usar sua linguagem nem universalizar suas gírias. Daniela Mercury, canta, dança, embala, passa por todos os ritmos e como todo ser humano passível de erro, percorre por caminhos duvidosos, ainda assim tomada de coragem e ousadia. Seus discos conseguem ser muito diferentes um dos outros, sem seguir uma linha, mesmo que sejam classificados de ruins ou medianos. Do figurino ao “boa noite” é estudado o que ela quer dizer e o que quer transmitir. Insere cultura e é despretensiosa ao mesmo tempo, quando envoca os hits de axé no trio. Tanta diversidade a afastou do título de cantora de axé, que ela não nega, mas resgata sempre que alguém diz que ela o abandonou. Polêmica com objetivos, inteligente e vencedora. Hoje, Daniela não vive o auge do sucesso e nem é figurinha fácil na imprensa ou na TV, mas alcançou um patamar de respeito e um ideal artístico, alguém que tem arquivo para mostrar e projetos a desenvolver. Não virão tantos prêmios populares como antes e nem tanto reconhecimento como se merecia, mas esta fase profissional é uma que os ícones e pop-stars como Madonna jamais vão chegar. Entenda-se isto como quiser.

Camille Paglia mostrou em seu artigo um fato que muitos não querem enxergar. (Para os interessados em ler, ao final do texto seguem links com as matérias publicadas por ela). Daniela Mercury é uma grande diva, uma rainha nata, que mantém muitos súditos aos seus pés. Não tantos quanto os de Madonna, mas cá entre nós, qualidade é discutível. Daniela faz no carnaval de Salvador e nas suas apresentações coisas que Madonna já mostrou não ser capaz de fazer (sim, isto é uma provocação). Cantar, dançar, pular, emocionar e girar inúmeras vezes sem tirar a ponta do pé do lugar. Daniela faz tudo isso sem ofegar uma única vez e provavelmente esbravejaria se alguém mencionasse a idéia dela usar um “playback” para diminuir seu esforço. Isto é provável. Não tentem dizer que há controvérsias. E o melhor, é que outras cantoras baianas também o fazem.

Algumas emissoras estão brigando para transmitir o show de Madonna no Brasil. A cifra de publicidade é de quase cinco milhões de dólares. Se fechado o acordo, a transmissão em dezembro mostrará uma mega produção transmitida ao vivo e sem tradução. Ou seja, os brasileiros diante da TV e os boa parte dos que estarão no Maracanã vou entender apenas um “Boa noite, Brasil” cheio de sotaque e no final da apresentação um “Te amo, Brasil”. No dia seguinte, vários jornais darão uma manchete, “Madonna declara amor ao Brasil”, enquanto, uma rainha, Daniela Mercury continuará falante, expressiva e fazendo quem a acompanha entender de música, dança, cultura baiana sem se importar com o que dizem ao seu respeito. Feliz de nós que a reconhecemos e a coroamos com os merecidos créditos pulando sem fôlego atrás do seu trio.

Mais uma vez, que me desculpem os fãs da Madonna. Mas eu prefiro Maimbé.

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